O peso de cuidar dos outros: quando a escuta também adoece
Você cuida de tantas pessoas. Mas quem cuida de você? Essa pergunta ecoa em muitos psicólogos que, em silêncio, carregam não apenas o sofrimento de seus pacientes, mas também o seu próprio. A sobrecarga emocional em psicólogos é real, crescente e precisa ser nomeada — com coragem, sensibilidade e responsabilidade.
Estar do outro lado da escuta exige uma entrega intensa. A cada sessão, o psicólogo acolhe histórias de dor, trauma, ansiedade, luto e angústia. Essa escuta, apesar de essencial, pode se tornar emocionalmente desgastante quando não acompanhada de espaços de elaboração e cuidado pessoal. Além disso, a prática clínica, muitas vezes solitária, pode gerar isolamento e sensação de esgotamento.
A principal dificuldade de um psicólogo
Qual a maior dificuldade enfrentada por quem cuida da saúde mental dos outros? Muitas vezes, é justamente reconhecer o próprio limite. A ética da profissão incentiva o acolhimento incondicional. No entanto, o excesso de empatia sem autorregulação pode levar à exaustão. Por isso, uma das grandes dificuldades é manter o equilíbrio entre escutar profundamente o outro e proteger a si mesmo.
De acordo com estudos recentes, a sobrecarga emocional é uma das principais causas de adoecimento entre profissionais da saúde mental. A pesquisa “Saúde Mental dos Psicólogos no Brasil”, publicada pela Fiocruz, revelou que mais de 60% dos profissionais relatam sintomas de ansiedade, cansaço extremo e perda de sentido na prática clínica.
Quantas horas um psicólogo pode trabalhar sem se esgotar?
Não existe uma fórmula exata, mas existem limites. A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou o projeto que propõe jornada máxima de 30 horas semanais para psicólogos. Isso reflete o reconhecimento de que o trabalho emocional é, sim, exaustivo.
Contudo, muitos psicólogos ultrapassam esse limite facilmente, especialmente os que atuam em várias frentes: clínica, escola, empresa, projetos sociais. O risco é alto: quanto mais se estende a jornada sem pausas adequadas, maior o desgaste psíquico. Por isso, a organização da agenda deve priorizar qualidade, não apenas quantidade.
Como a sobrecarga afeta a saúde mental do psicólogo?
Escutar o outro sem parar pode silenciar a si mesmo. A sobrecarga emocional pode se manifestar de diversas formas: insônia, irritabilidade, desânimo, dificuldade de concentração, sensação de inutilidade, entre outros sintomas. Em casos mais graves, pode evoluir para depressão, ansiedade crônica e burnout.
Estudos indicam que psicólogos têm alto risco de desenvolver transtornos mentais relacionados ao trabalho, especialmente quando não possuem supervisão clínica, espaços de troca profissional ou momentos de autocuidado. Além disso, o estigma de que “psicólogo não pode sofrer” contribui para o silêncio e o agravamento do quadro.
A importância da supervisão e da escuta entre pares
Ninguém caminha sozinho — nem mesmo quem escuta. Ter um espaço de supervisão regular é essencial para que o psicólogo possa elaborar os impactos emocionais das escutas clínicas. Conversar com outros profissionais, trocar experiências e acolher fragilidades também é uma forma de cuidado.
No artigo dicas para psicanalistas iniciantes, discutimos como a supervisão e o estudo contínuo são pilares fundamentais para quem deseja atuar com ética e saúde. A prática clínica não se sustenta apenas na técnica, mas na sustentação emocional de quem a exerce.
A postura do psicólogo diante da própria dor
Como deve ser a postura de um psicólogo que também sofre? Humana. Ética. Responsável. Reconhecer-se em sofrimento é um gesto de coragem, não de fraqueza. O psicólogo não é imune à dor. Ele apenas aprendeu a escutar com mais profundidade. Por isso, deve também ser capaz de voltar essa escuta para si.
Ter um terapeuta, fazer pausas, estudar, se afastar quando necessário — tudo isso é cuidado ético. Não há vergonha em buscar ajuda. Pelo contrário: é um exemplo de coerência e humanidade. Além disso, é uma forma de garantir que a escuta oferecida ao outro seja genuína e não contaminada pelo próprio esgotamento.
Soluções possíveis: do autocuidado ao suporte institucional
Existem caminhos para que o psicólogo não adoeça. Alguns deles são individuais, como a prática de atividades prazerosas, a organização da agenda com limites claros e o acompanhamento terapêutico pessoal. Outros são coletivos e institucionais: grupos de estudo, supervisão, redes de apoio e regulamentações justas de carga horária.
Uma dessas soluções é investir em formação contínua, mas de maneira saudável. A plataforma OrlandoFlix oferece um espaço seguro e acessível para profissionais aprofundarem seus saberes com autonomia, leveza e profundidade. Estudar pode ser também uma forma de se cuidar.
No canal do Instituto Marçal no YouTube, você encontra vídeos com reflexões sobre escuta, ética, sofrimento emocional e a clínica contemporânea. Consumir conteúdos que alimentam a alma e fortalecem o pensamento crítico é um gesto potente de autocuidado.
Conclusão
Se você é psicólogo e se sente cansado, sobrecarregado ou até mesmo sem sentido na prática clínica, pare um momento. Respire. E reconheça sua dor como legítima. Você não está só. A escuta que você oferece ao outro também merece ser recebida.
Cuidar de si não é egoísmo — é ética profissional. Compartilhe este conteúdo com colegas, converse sobre seus limites, busque apoio. E lembre-se: ninguém precisa dar conta de tudo sozinho. A psicanálise, o psicanalista e o cuidado com quem cuida também fazem parte do processo de transformação.